terça-feira, 8 de setembro de 2015

thump.

às vezes, eu sinto como se eu pudesse escutar tudo ao meu redor.

ouço as pessoas falando. as mentes delas se agitando. ouço sentimentos, desejos, temores. ouço a cidade. os carros, as ruas, os pássaros e a eletricidade. os canos das casas. a grama crescendo. o esgoto fluindo.

eu também me ouço. ouço meu sangue correndo pelas minhas veias, quente, vermelho, suave. salgado. ouço meus pensamentos correndo rápido pelo meu cérebro. as vontades sumindo em meio às minhas ações. ouço quem eu sou. quem eu devia ser. quem eu nunca foi.

mas também tem o que eu não ouço. amor. bondade. perdão. tem o que eu não sei ouvir. gentileza. poesia. eu. ouço tudo, e nada escuto - especialmente quando, dentre tudo o que eu ouço, tudo o que eu queria ouvir era o thump que meu corpo faria ao se espatifar no chão quando eu cedesse aos meus desejos mais intrínsecos e pulasse do 23o andar.

sábado, 6 de setembro de 2014

inutilia truncat.

uma das coisas mais difíceis que eu tive que aprender a fazer na minha vida foi aprender a me livrar do que não me faz bem. sendo bem honesta, talvez eu ainda não tenha dominado essa arte. 

sou uma pessoa de hábitos. previsível e confiável. gosto de acordar sempre no mesmo horário e realizar as minhas tarefas numa ordem bem estabelecida. tenho os mesmos amigos há anos e fazemos sempre as mesmas coisas. escrevo os prontuários na mesma ordem, com a mesma paragrafação, desde a propedêutica. Sempre leio a revista do final pro começo. pensar em fazer qualquer coisa que pertence à minha rotina de outra maneira é muito difícil pra mim - mas às vezes é necessário.

amizades, por exemplo. algumas amizades são tóxicas. mesmo sabendo disso, eu sempre fui do tipo que queria manter os amigos. já engoli muito sapo fazendo o que os outros queriam, pedindo desculpas sem ter feito nada, lutando pra manter amizades que obviamente não me acrescentam nada. levei alguns anos de terapia pra deixar de fazer isso. hoje, minhas amizades passam por uma análise honesta e criteriosa toda vez que existe algum tipo de crise. eu estou errada? a pessoa está errada? essa amizade está me fazendo bem? se a última pergunta tiver uma resposta negativa, o amigo em questão vai automaticamente pra geladeira. sem rancor. sem briga. sem mágoa. só cortando o mal pela raiz pra evitar que ele se prolongue.

hábitos. hábitos são muito difíceis de serem mudados. trabalho semanalmente na terapia em tentar ser mais flexível com eles, mas tenho falhado miseravelmente nessa tarefa. preciso aprender a me libertar mais, a deixar de lado tudo o que me deixa chata, amarga, irritada e dar espaço pro que me faz uma pessoa melhor. mas como deixar de fazer as coisas da maneira que você sempre fez? não sei. preciso aprender. 

mas, pra mim, o mais difícil é mudar a forma como lido com os meus relacionamentos. sou a pessoa mais cabeça-dura do universo quando me apaixono. gasto tempo, dedicação e amor com o objeto da minha afeição, mas mesmo com todos os esforços, às vezes as coisas não dão certo. e é tão difícil se livrar de algo que você idealizou, mesmo quando você sabe que não vai dar certo... tão doloroso. é fisicamente dolorido ter que dar adeus a alguém que você amou porque essa pessoa já não te faz bem, não te faz feliz - mesmo quando se tem consciência de que essa é a única saída antes de um relacionamento legal virar um amontoado de rancor, de ódio, de mágoa. talvez por isso eu evite me apegar excessivamente às pessoas. porque sei que, cedo ou tarde, inutilia truncat será a única saída.

domingo, 22 de junho de 2014

sobre fuscas e harley davidsons.

na primeira vez em que eu te vi, você estava numas de the doors com aquele cabelo parecido com o do slash, uns jeans surrados que pareciam mais velhos do que os seus 15 anos e jaqueta de couro em pleno verão. eu não gostava do seu cabelo, só que gostei de você e decidi naquele momento que aquele beijo que você me deu no ginásio da escola seria um daqueles beijos que eu jamais esqueceria. eu era uma menina esquisita de 17 anos e cabelo cherry bomb, e você era tão descoladinho e away com as suas camisas de banda que parece impossível que sejamos ainda as mesmas pessoas.

na primeira vez em que eu me apaixonei por você, eu já era muito madura com meus 18 anos recém completados e te achava um pirralho intrometido tocando baixo naquela sua bandinha de rock. eu ficava irritadíssima pensando que um rapaz quase imberbe me fazia pensar em romance - especialmente porque eu sempre soube que um romance entre a gente não tinha nada a ver. deixei passar, você nunca soube, e a gente não perdeu nada por isso.

na primeira vez em que a gente transou, foi desejo e nervosismo e culpa e calor. eu lembro do lençol azul da sua cama e do gosto de tequila na sua boca, mas tudo foi tão esquisito que o resto das memórias se perde numa onda de nervosismo que faz meu estômago revirar. foi bom, eu sei que foi. sempre é bom entre nós. gosto do seu cheiro, gosto do seu gosto, gosto da sua pele e da sua boca, e a gente tem essa química estranha que faz ter vontade de nunca mais sair da sua cama.

na primeira vez em que eu te perdi, eu sequer notei o que havia acontecido. estava sofrendo um dos dramas que só existem na minha cabeça e não notei que você estava ao meu lado, com seu humor ácido e seus braços quentes. e aí alguém soube ver melhor do que eu e, sem eu nem perceber, você tinha ido embora. você não sabe, mas foi doloroso e confuso te perder, porque quando você foi embora, fiquei sentindo como se eu mesma tivesse me perdido.

e agora, na primeira vez em que escrevo sobre você, eu nem sei por que o faço. I mean. teoricamente, eu nem gosto de você. você não sabe direito o que quer da vida. você não tem foco e nem prioridades. num dia gosta de fusca, no outro compra uma harley davidson. você é mulherengo e tem o péssimo hábito de trair suas namoradas comigo. você é independente demais. tem amigos demais. é carismático demais. bebe demais. as nossas personalidades são tão diferentes que parece impossível que ainda estejamos nessa dança desencontrada um pela órbita do outro depois de todos esses anos. mas estamos.

sexta-feira, 7 de março de 2014

solilóquio do embotamento.

Eu acho que quero morrer.

Não me entenda mal. Não é como se eu não quisesse mais viver. Não é como se eu fosse me matar. Só acho que morrer seria mais... Adequado. Sei lá.

De uns tempos pra cá, a vida tem perdido cada vez mais seu brilho pra mim. Nada me comove. Nada me emociona. Não sinto nada diferente. Não quero fazer nada. Não quero ser nada. Não quero o que eu tenho. Não sinto saudade do que tive. Não anseio pelo que vou ter.

O termo que a gente usa na medicina pra isso é... Embotamento. Isso. Embotamento. Uma sensação de não sentir. Uma vida vivida sem viver.

Durante a depressão, tudo o que eu queria era parar de sentir. Queria que as emoções dentro de mim sumissem. Queria criar uma parede intransponível entre a agonia, a tristeza, o desespero e eu mesma. Usei remédio pra isso durante algum tempo. O antidepressivo nada mais faz do que te colocar pra morar dentro de uma bola de equilíbrio e tranquilidade - e para alguém que sentia e sofria o tempo todo, foi um alívio tremendo. Poder respirar. Poder viver.

Mas aí. Aí não sei. Depois de tudo, eu me acostumei a ter medo de sentir.  Acho que meu subconsciente associa sentir e sofrer. Pouco a pouco, fui me treinando para não deixar mais nenhuma das duas coisas acontecerem. Me fechar pras emoções externas era a única forma de sobreviver.

Só que sobreviver não tem sentido se você não tem vontade de viver. Sobreviver assim, sem cor e  sem som e sem luz e sem sabor, só pra sobreviver, é tão vazio quanto morrer.

A diferença é que morrer é mais rápido. E provavelmente muito mais efetivo.

sábado, 22 de fevereiro de 2014

nina.

nina diz que tem a pele cor de neve
e dois olhos negros como o breu
nina diz que, embora nova
por amores já chorou que nem viúva
mas acabou, esqueceu
nina adora viajar, mas não se atreve
num país distante como o meu
nina diz que fez meu mapa
e no céu o meu destino rapta
o seu
nina diz que se quiser eu posso ver na tela
a cidade, o bairro, a chaminé da casa dela
posso imaginar por dentro a casa
a roupa que ela usa, as mechas, a tiara
posso até adivinhar a cara que ela faz
quando me escreve
nina anseia por me conhecer em breve
me levar para a noite de moscou
sempre que esta valsa toca
fecho os olhos, bebo alguma vodca
e vou...


[nina, chico buarque]

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

young and beautiful.

é fácil amar.

é fácil amar cabelos macios e cheirosos. pele sedosa e macia. sorrisos brancos e pálidos e com cheiro de de lírios e flor de laranjeira. é fácil amar beijos com gosto de bala de goma. gosto de sorrisos escondidos, gosto de amores mal contados. é fácil amar pernas delicadas e depiladas. braços lânguidos ao redor do seu pescoço. suspiros e pequenos sussuros de amor. frases inesperadas, risinhos pela metade, olhares quase escondidos. amar assim é fácil.

mas é difícil amar de verdade.

é difícil amar aquilo que você não vê. amargura. cinismo. aquelas marcas no corpo que passam despercebidas à luz do luar. aquelas marcas na alma que são fáceis de esconder assim, por cima, mas que são impossíveis de deixar por baixo da cobertura se alguém resolve te conhecer de verdade. é difícil deixar alguém conhecer suas fraquezas, seus erros, o que falta em você. amar assim é difícil.

amar é fácil. difícil é me amar.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

THIS.

'don't you see? don't you understand? you're the love of my life. I can't leave you. but you're constantly leaving me.'

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

retrospectiva.

2013 foi eternidade. durou 3 longos semestres, com uma semana de férias entre cada um. parece-me que o intervalo entre o dezembro de agora e o anterior foi de milênios. tenho a impressão de que envelheci muito nesse tempo. nada é real exceto o presente, e mesmo assim, sinto como se o peso de séculos estivesse se acumulando sobre mim e me esmagando nesse verão.

2013 foi perder. perdi uma colega de turma para o desespero que te faz pensar que a única opção é desistir. perdi minha melhor amiga para uma bobagem mal dita que acabou se transformando em ódio. perdi meu tio e meu segundo pai para a inefabilidade, a inevitabilidade da morte. perdi a mim mesma dentro do sofrimento por tudo o que eu perdi. perdi um pouco da minha credibilidade no universo e nas outras pessoas. perdi um pouco de mim e fiquei um pouquinho menos jana.

2013 foi aprendizado. sinto como se tivesse aprendido mais em 1 ano de internato do que aprendi em 4 anos de faculdade. finalmente descobri o que quero fazer pelo resto da minha vida - e, ao contrário do que eu sempre imaginei, envolve sangue e bisturis. a parte mais importante do aprendizado, entretanto, não foi a acadêmica: nesse ano, eu mergulhei em mim mesma como nunca tive a oportunidade [e nem a vontade] de fazer antes. aprendi a reconhecer meus defeitos e a tentar melhorá-los. aprendi a compreender melhor minha família. aprendi a amar melhor. aprendi a ser uma pessoa melhor.

2013 foi ganhar. no meio de gente tão diferente de mim, eu ganhei amigos. no meio dos amigos dos outros, eu ganhei outros amigos. no meio da minha família, eu encontrei amigos incríveis. no meio dos meus próprios amigos, eu ganhei uma família bizarra e feliz. ganhei um monte de gente. ganhei muito ao descobrir que a melhor forma de ganhar é perceber o quão importantes são as pessoas ao seu redor.

2013 foi apaixonante. me apaixonei por um livro que fala sobre um menino e uma menina com câncer em amsterdan. me apaixonei pelo peeta mellark. me [re]apaixonei pelos poemas da sylvia plath e pela voz da ella fitzgerald e até pela medicina. me apaixonei por jardinagem. me apaixonei por lírios. me apaixonei por alguém que me faz apaixonar todo dia um pouquinho mais.

2013 foi. foi um ano esquisito, cheio de altos e baixos, que parecia anáfora até quase terminar e, agora que termina, mostra que nada mais é do que alegoria, do que silepse, do que preâmbulo para um 2014 que - espero eu - vai ser maravilhoso.

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

always.

I breathe you
I taste you
I can't live without you.


odeio sua soberba. odeio sua petulância. odeio sua arrogância. odeio sua falta de objetividade. odeio sua grosseria. odeio seu jeito de dirigir. odeio seu jeito de escrever. odeio sua lascívia. odeio sua babaquice quando você está com os seus amigos. odeio seu descaso.

odeio sua voz. odeio seu nariz. odeio sua boca. odeio seus sorrisos. odeio os pelinhos do seu braço. odeio seus abraços. odeio sua barba. odeio seu cheiro. odeio seu calor. odeio suas mordidas. odeio seus beijos. odeio o fato de você existir.

odeio você.

ou pelo menos é disso que eu tento me convencer todos os dias.

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

hello darkness, my old friend.

você sabe reconhecer os sintomas desde que era criança.

o primeiro é não conseguir prestar atenção em mais nada. você, que sempre foi uma pessoa atenta, começa a não conseguir se concentrar nas coisas. deixa capítulos de livros pela metade. demora pra arrancar quando o sinal fica verde. perde o fio da meada nas conversas com seus amigos.

depois, seus padrões de sono começam a mudar. primeiro você sente muito sono. muito cansaço o tempo todo. tudo é demais para você, tudo exige demais, e você não sente vontade de fazer mais nada além de dormir. dorme o dia todo. não faz mais nada além de dormir, e isso começa a te preocupar. então você pára de dormir, e passa dias acordada, preocupada, pensando em o que fazer para poder resolver o que você sabe que está errado, sofrendo porque sabe que não pode fazer nada além de esperar. cada vez mais cansada. cada vez mais distante. cada vez mais fora de si mesma.

tudo na sua cabeça está bagunçado. você sente os pensamentos se misturarem, se sobreporem, e pouco a pouco eles param de fazer sentido. na verdade, o mundo começa a perder o sentido. tudo vira ondas e partículas e energia e nada disso faz sentido. nada mais importa. você só quer sumir. esses são os piores dias. você sabe, lá no fundo, que cedo ou tarde tudo vai voltar ao normal. pode não ficar tudo bem, mas vai ficar suportável, você vai sair dessa.

mas até lá, tudo é cinza e cansaço e fraqueza e nada tem o mínimo de sentido. você quer morrer, você quer sumir, mas você não morre, você não some. você é forte. não é a primeira vez que isso acontece. não vai ser a última. você sabe lidar com isso. de uma forma errada e torturante, mas sabe. no fundo, você sabe que vai ficar tudo bem.